segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Medicamentos genéricos: simplificando e nacionalizando os testes

 
Jornal do BrasilVera Maura Fernandes* e José Roberto Castilho Piqueira** 
 
 
O mercado farmacêutico no Brasil movimentou, em 2011, R$ 43 bilhões e vem crescendo a taxas de dois dígitos percentuais nos últimos cinco anos. Como o principal comprador é o governo, seja na esfera federal, estadual ou municipal, há, portanto, um grande aporte de recursos públicos nessa importante área.

Deve-se considerar, entretanto, que a indústria fornecedora importa 80% dos insumos básicos e, dos 20 maiores laboratórios ditos nacionais, só dois são brasileiros de origem e ficam na terceira e décima sexta posição, em termos de participação no mercado.

Os insumos, predominantemente importados, são transformados em medicamentos ditos de referência, quando a formulação é a original. As cópias dessa formulação que utilizam os mesmos insumos são vendidas como medicamentos similares ou genéricos.

O registro dos genéricos obriga a demonstração pela indústria de que o comportamento em 10 seres humanos saudáveis com respeito à absorção, metabolismo e excreção, medidos pela farmacocinética, é semelhante ao da preparação original. Isso é feito uma única vez, na ocasião do registro.
Há, entretanto, um método para a medida de bioeficácia que foi desenvolvido a partir de um modelo experimental, totalmente feito no Brasil, por Hiss Martins-Ferreira e Gilberto Oliveira e Castro, e de um contexto teórico fundamentado na teoria de sistemas excitáveis.

Em um estudo comparativo sobre a bioeficácia e formulações, realizado na Universidade de Hohenheim, em colaboração com a Anvisa e publicado este ano no periódico The Open Pharmachology Journal, ISSN: 1874-1436 - Volume 6, 2012, 1-11, foi demonstrado que é possível comparar a eficácia e segurança de insumos, preparações e novos compostos de forma simples e barata que pode ser repetida lote a lote.

Nesse estudo, insumos e preparações foram comparados, e o método demonstrou a mesma sensibilidade da ferramenta química usada atualmente, isto é, a cromatografia (HPLC). Além disso, a robustez do novo método foi validada. Os resultados corroboraram fatos interessantes: o medicamento similar, obtido pela cópia fiel da formulação de referência, com rigorosa reprodutibilidade, foi o que obteve melhores resultados, mesmo com pequena variância na preparação referência.

Outro genérico com a mesma fórmula, mas com maior variância na composição, apresentou, quando testado pelos novos métodos, resultados também mais variáveis na bioeficácia. Um terceiro mudou a formulação e os testes pela nova metodologia indicaram mudanças consideráveis na farmacocinética (absorção e distribuição) e na farmacodinâmica (comportamento em modelo biológico).
Entretanto, pelo que se sabe, os dois — o de grande variância nos componentes lote a lote e o de fórmula alterada — receberam o mesmo registro. Fica, então, a hipótese de que o novo método, baseado na dinâmica de sistemas excitáveis, além de nacional, mais prático e mais barato, é superior tecnicamente ao modelo adotado atualmente.

A importação de insumos levou a Anvisa à resolução (resolução RDC 57/2009) de registrá-los. A quantidade de fornecedores internacionais, particularmente da China e da Índia, exige a criação de plataformas que gerem bancos de dados para o controle de qualidade das aquisições.
Essa é mais uma vantagem da nova metodologia de testes: sistematização de conhecimento em plataformas robotizadas, permitindo a criação de banco de dados, descentralizando o controle e aquisição da tecnologia pelas indústrias ou por grandes compradores como as farmácias dos hospitais públicos.

Isso evitaria acidentes como aquele de um dono de indústria do Rio de Janeiro que resolveu sintetizar o contraste sulfato de bário. A contaminação com carbonato matou onze pessoas. Caso houvesse, ao seu alcance, método padronizado de testes em modelo biológico rápido e barato, isso seria evitado e daríamos um passo importante para a independência na produção de insumos e não para a tragédia.
Nosso amigo Henrique Del Nero nos ensinou que cérebros são individuais, mas mentes sempre coletivas. Neste século 21, a criação de poderosas mentes coletivas baseadas na tecnologia de informação vai revolucionar todos os campos de conhecimento.

A química orgânica já começou a sistematizar todas as vias conhecidas de síntese de compostos em memória coletiva ao alcance de todo neófito. O modelo desenvolvido por Hiss Martins-Ferreira e Gilberto Oliviera e Castro já acumula 60 anos de pesquisa básica e está pronto para a sistematização.
É um exemplo de serventia da universidade modelo tradicional e de pesquisa básica, feita pela curiosidade do saber que acaba dando frutos tecnológicos inesperados.

*Vera Maura Fernandes de Lima é professora titular da UFSJ e pesquisadora do LIM-26 da FMUSP; **José Roberto Castilho Piqueira é vice-diretor da Poli-USP.

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